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Monitoramento do solo e sinalização de vias podem ajudar a prevenir danos e reduzir impacto financeiro causado por temporais

Enchentes, enxurradas e deslizamentos causados pelas chuvas intensas têm deixado rastros de destruição e tragédia por todo o estado de São Paulo, principalmente em cidades do interior. Esses desastres naturais, aparentemente imprevisíveis, podem ser evitados, caso haja um trabalho preventivo por parte dos órgãos públicos, segundo o engenheiro civil e especialista em geotecnia Luciano Machado. Mas como o poder público pode adotar políticas para prevenir esses problemas no curto prazo?

"Com a tecnologia disponível hoje, sabemos onde vai chover com mais intensidade ou não, a condição do solo de cada região, onde há riscos de desabamentos, deslizamentos e acidentes no geral. O problema é que, muitas vezes, os órgãos públicos fazem as reparações necessárias depois que o pior acontece", afirma Machado, que é sócio da MMF Projetos.

O momento ideal para adotar estratégias de prevenção que evitem prejuízos financeiros e, sobretudo, perdas humanas, é a época de estiagem. "Podemos tratar tudo isso e evitar tragédias por meio de projetos, obras de infraestrutura e, de preferência, antecipadamente", diz.

O especialista em geotecnia, que estuda as reações do solo, afirma que, na maioria das vezes, os órgãos responsáveis começam a se preparar para a manutenção ou a construção de mecanismos que evitam esses acidentes quando alguma tragédia, com mortos, feridos e destruição, ocorre.

Uma ação preventiva citada por Machado é a cratera que se abriu na marginal Tietê e afetou ao menos três faixas da via. Apesar do caos e trânsito na região, não houve feridos nem mortos. "Como a movimentação do solo foi detectada, houve tempo suficiente para fazer o isolamento da área e evitar acidentes", ressalta.

Às vesperas da virada de ano, uma família morreu após o veículo que utilizava ser arrastado por um córrego e cair em uma cratera que se abriu em uma avenida de Araraquara, no interior de São Paulo.

Os corpos da mãe, dos dois filhos gêmeos e do casal de cunhados foram encontrados boiando no volume de águas acumulado pela forte chuva que atingiu a cidade. Mas, como pondera o especialista, se tivesse tido alguma sinalização prévia, essa tragédida poderia ter sido prevenida.

Um morador do município também acredita que as mortes poderiam ter sido evitadas. "Não sou engenheiro, mas era possível notar que a tubulação que colocaram na avenida não suportaria uma grande quantidade de chuva, que tem sido constante aqui", afirma.

"A gente paga caríssimo em impostos e não são usados para fazer manutenção em vias onde todo mundo passa, e o resultado são finais trágicos como este, infelizmente", lamenta o homem, que preferiu não ser identificado.

Além de Araraquara, diversas regiões de São Paulo sofreram com a intensidade da chuva no ano passado. Somente até fevereiro de 2022, a Defesa Civil dos municípios da Bahia, Minas Gerais, São Paulo e do Rio de Janeiro contabilizava 254 mortos, além das 40.478 pessoas desabrigadas e 127.740 desalojadas.

O cenário trazido pelas chuvas, de acordo com a coordenadora de incidência política na ONG Habitat Brasil, Raquel Ludemir, revela que essas catástrofes não são "simplesmente" ambientais, mas socioambientais, porque "acontecem todos os anos e, muitas das vezes em lugares que já foram afetados antes, e os efeitos disso têm um perfil econômico muito expressivo: a população mais empobrecida do país", ressalta.

Defesa Civil alerta para mais chuva intensa em São Paulo

A Defesa Civil emitiu um alerta para o estado sobre chuvas fortes entre os dias 3 e 6 de janeiro, mas, em nota enviada ao R7, o órgão afirmou que essa condição deve se intensificar devido às condições climáticas nos próximos dias.

"Diante deste cenário meteorológico, faz-se necessário orientar a população sobre o risco e medidas preventivas que deve adotar, como a atenção para qualquer sinal de perigo, seja desabamentos, desmoronamentos, deslizamentos, inundações, enxurradas e até raios", escreveu.

Vale ressaltar que o fenômeno La Niña impacta o clima em todo o Brasil e, apesar de esperadas no verão, as chuvas devem ocorrer de forma ainda mais intensa, de acordo com o meteorologista do Inmet (Instituto Nacional de Meteorologia) Memedes Luiz Melo. "Fenômenos meteorológicos como o La Niña e a Zona de Convergência do Atlântico Sul devem trazer uma chuva mais expressiva durante esse período", afirma.

Até o fim de janeiro, segundo Melo, as chuvas devem ser irregulares no estado. No meio do segundo mês do ano, esses temporais expressivos devem diminuir, e o sol passa a predominar. Em fevereiro São Paulo deve ficar "abaixo da média normal de chuvas para o mês", ressalta.

Em março, alguns dias devem ser marcados por chuvas irregulares, mas, com menos frequência do que foi visto nos primeiros meses do ano. O meteorologista diz que o período deve sofrer uma oscilação climática, com dias extremamente quentes, outros frios e ainda com chuvas e temporais, variando por regiões no estado.

Em relação ao cenário nacional, a previsão feita por Melo é também de chuva nos três primeiros meses, principalmente no centro-norte. Para o centro-sul do país são previstos temporais intensos com rajadas de vento e granizo.

 

Regiões mais propícias a acidentes

Machado afirma que, em quase todas as vezes, deslizamentos e desabamentos ocorrem em áreas de risco, principalmente em periferias. "Ninguém mora em regiões de risco por opção. Em casos assim, é muito difícil conseguir salvar os bens materiais, mas temos de prezar pela vida das pessoas, informando-as sobre a previsão".

O engenheiro ressalta a importância de as autoridades criarem mais mecanismos para habitação e tirarem essas pessoas da condição de precariedade em que enfrentam o risco de perder tudo o que têm de uma hora para outra.

A recomendação da Defesa Civil à população que mora nessas regiões é de "não atravessar áreas inundadas ou enfrentar enxurradas, estar atento aos sinais de movimentação do solo, como postes e árvores inclinadas, rachaduras na parede e portas e janelas emperradas".

Segundo o órgão, a força da água é tanta que arrasta pessoas, veículos e até moradias. Uma das soluções para esses problemas, aponta Machado, seria a criação de políticas de orientações para que o lixo não seja depositado nos córregos, além do desenvolvimento de novas estruturas, como piscinões e reservatórios para conter o excesso de água".

 

Fonte: https://bit.ly/3X1Gncd